A concessão da Companhia de Água e Esgoto do Estado do Rio de Janeiro para a iniciativa privada é o primeiro megaprojeto de concessão, após regulamentação do novo marco regulatório do saneamento e que envolve cifras que ultrapassam a casa dos 50 bilhões de reais.
Ela foi feita em um modelo inovador no país ao dividir um mesmo município em concessões distintas, pondo fim a quatro anos de batalhas políticas e jurídicas desde que o estado ingressou no Regime de Recuperação Fiscal da União, já que a venda da Cedae era condição do programa.
Acontecendo após mais de um ano e em que parte da população fluminense é abastecida com água de má qualidade, em uma das piores crises hídricas e sanitárias da história do estado.
As metas desse plano de concessão são muito ousadas:
1 – Prazo de apenas 12 anos até 2033, 90% do esgoto terá que ser coletado e tratado.
2 – 99% da população terá que ter abastecimento com água tratada.
Atualmente, mais de 1,6 milhão de pessoas não têm acesso a água potável no RJ, o que corresponde a 9,5% da população. O desafio é imenso, considerando os dados atuais.
Essa concessão vem sendo discutida há mais de uma década, diante da completa falência dos serviços do Estado na questão do saneamento básico. Para você ter uma ideia do que acontece com o serviço de entrega de água no Rio de Janeiro, desde meados de 2020, as pessoas recebem água com fezes humanas nas suas bicas, acredite se quiser.
Poucas empresas estatais conseguiram na história entregar alguma coisa tão bizarra quanto isso e olha que os serviços delas são péssimos, via de regra, mas vamos falar desses problemas mais pra frente.
É bom que você entenda, desde a largada, que a Cedae não foi privatizada, mas sim concedida por meio de um leilão público que ocorreu no dia 20 de abril de 2021. A concessão foi, por 35 anos, para as empresas Aegea, que levou os blocos 1 e 4. Já o bloco 2 ficou com a empresa Iguá e o bloco 3 não saiu, mas será leiloado em um segundo momento.
Esse leilão público arrecadou mais de R$22,6 bilhões, valor que superou a expectativa de arrecadação inicial, que era de R$10,6 bilhões, em 114%. Além disso, garantiu mais R$30 bilhões em investimentos nos próximos 35 anos, o que somatiza R$52,6 bilhões até 2033, sendo R$12 bilhões já nos 5 primeiros anos, obrigatoriamente. Em cerca de uma hora de leilão, os três blocos mais valiosos já tinham sido arrematados com ágio superior a 100% em relação ao valor inicial. Ágio, se você ainda não sabe, nada mais é do que o valor que supera o mínimo do que era exigido no edital.
Ao todo, 12 empresas, nacionais e estrangeiras, demonstraram interesse pelo projeto, mas para a disputa final foram formados quatro consórcios empresariais, cada um liderado por grandes investidores.
Mas, você ainda pode estar confuso e querendo saber exatamente o que foi leiloado:
- Responsabilidade de promover o Saneamento;
- Tratamento do Saneamento;
- Distribuição de água;
- Agora entenda porque a Cedae não será totalmente privatizada.
Uma parte dela continuará estatal e responsável pela captação e tratamento da água – as concessionárias vão comprar a água do estado para distribuir à população.
Bom, o fato é que existe uma dívida histórica com o povo que é o saneamento básico e que nunca foi pago. Se o estado não foi capaz de fazer, vamos ver se o livre mercado fará.
Diante de uma relação de mercado teremos claros benefícios com essa concessão como, por exemplo, agora há uma obrigatoriedade real de entregar o saneamento básico universal e o tratamento do esgoto no Rio de Janeiro. Algo que antes era sumariamente ignorado pelo Estado e que ninguém nunca resolveu e tampouco foi punido efetivamente.
Por isso, agora, você vai poder romper o contrato, punir a empresa e cobrar resultados, finalmente, uma relação racional numa área tão fundamental para a população. Agora existem metas claras como, por exemplo, até 2033 as empresas vão precisar entregar o saneamento básico universal do esgoto. Isso é uma vitória muito grande, pois agora sabemos o quê, quando e como será feito o que até então era um completo vazio de respostas.
Ainda assim, muitos foram contra essa concessão que foi uma guerra sair do papel e para estas pessoas eu deixo a seguinte reflexão: de onde o governo do Rio de Janeiro iria tirar R$52,6 bilhões até 2033? E, mesmo que inventassem esse dinheiro, vocês acham que ele entregaria de fato todo o saneamento básico feito?
Sempre prometeram e nunca entregaram! É óbvio que, no mínimo, iriam empurrar mais um imposto qualquer ou aumentar as tarifas de água e esgoto, desviar esse dinheiro para sustentar os grupos políticos que se alimentam desse sistema como sempre fizeram. Enquanto isso, as crianças cariocas continuariam pegando leptospirose ou outras doenças em algum valão qualquer das favelas do Rio de Janeiro.
Nunca foi diferente, não seria agora que o milagre seria feito, ainda mais pelas mãos do Cláudio Castro, governador em exercício que assumiu após o impeachment do Ex-governador e juiz Wilson Witzel, condenado por ter roubado dinheiro público da saúde durante a pandemia, olha o nível dessa gente. Essa concessão sofreu diversas pressões, inclusive dos funcionários da CEDAE.
É claro que a CEDAE tem, dentro dos seus milhares de funcionários, vários que são técnicos honestos que sempre vestiram a sua camisa, e que, para sempre, serão um orgulho para o Rio de Janeiro. Porém, a verdade é que a empresa era um cabide de emprego absurdo, um monte de gente empregada com DAS, ou seja, cargos em comissão, apadrinhados por políticos.
Isso tudo levando a um grande nível de ineficiência e baixa capacidade de entrega dos serviços, já que o risco de demissão era político, não técnico. Enquanto isso, a população continuava sofrendo com falta de saneamento básico e consumindo até água com fezes humanas. Um tapa na cara de qualquer indivíduo coagido a pagar impostos para financiar esse tipo de coisa.
Certamente, com essa concessão, muitos funcionários serão demitidos e o temor disso foi a razão da ação que acabou levando o Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro a tentar impedir o leilão da CEDAE, por meio de uma liminar. Porém, os bons funcionários, os que realmente trabalham, com certeza serão preservados porque qualquer empresa orientada ao mercado precisa de gente técnica para funcionar. O que as empresas vão fazer é demitir esse caminhão de apadrinhados políticos que não entregavam absolutamente nada além de sangrar os cofres públicos.
Agora, o que vai ser gerado bom e investido pelas empresas?:
Além de tudo isso, está prevista a geração de 46 mil empregos, o que vai dinamizar a economia do estado, gerando renda e consumo e salvando dezenas de milhares de famílias destruídas pela pandemia.
Cerca de R$5,7 bilhões serão investidos, obrigatoriamente, na despoluição da baía de Guanabara e da bacia do Guandu, R$250 milhões para o complexo das lagoas da Barra da Tijuca. Também será obrigatório o investimento mínimo de R$1,8 bilhão na infraestrutura de favelas.
O contrato veta aumento real das tarifas cobradas dos consumidores e só será permitido o reajuste anual da inflação, cujo índice será definido pela agência reguladora. Bom isso aqui é um problema, mas a gente conversa sobre isso mais pro final. Agora, o mais incrível foi a briga política por trás disso.Para vocês terem ideia, a ALERJ, um dia antes, tentou impedir a concessão da CEDAE, numa articulação dos partidos de oposição e a justiça do trabalho também tentou impedir a concessão. Porém, o ministro Luiz Fux derrubou esta liminar e liberou o caminho para a concessão. Essa concessão só foi possível graças ao novo Marco Regulatório do Saneamento que passou a valer em 15 de julho de 2020. É graças a ele que atualmente o mercado enxerga, neste segmento, segurança jurídica e está vindo para cima com tudo para poder resolver anos de atraso de problemas que nós todos sabemos que o estado nunca resolveu e nunca irá resolver, porque isso não interessa a eles.
O dinheiro, os investidores, o interesse do setor privado, tudo isso existe, vemos esse tipo de investimento acontecer todos os dias no mundo todo. Ele só não acontece no Brasil porque não deixam, com todas as maluquices que se criam, não fazemos o nosso dever de casa em criar um ambiente favorável para que esse fluxo de investimentos venha.
Mas, quando damos um passo na direção certa, como foi com o novo Marco do Saneamento, desenhando um ambiente jurídico saudável para os investimentos, rapidamente, o dinheiro vem.
O Brasil é um país com gigantescas carências e um gargalo enorme de infra estrutura, o que não falta são portos, estradas, ferrovias, aeroportos, hidrelétricas, torres eólicas para fazer. E não falta dinheiro no mundo, nem no setor privado, nem interesse em fazer tudo isso. O que falta, mesmo, é competência da nossa parte para atraí-lo e isso dá a falsa impressão de que ninguém quer investir no Brasil, mas é o contrário, o leilão da CEDAE prova isso.
Por isso que essa vitória que se viu no Rio de Janeiro sirva de inspiração para as demais cidades e estados no Brasil a lutarem por mais liberdade.
É inegável que quando o assunto trata de serviços essenciais, como água e esgoto, paixões sejam inflamadas, no final ninguém quer que uma tragédia aconteça.
O Brasil é um país com um povo muito pobre, desempregado e desesperado em relação ao futuro, principalmente nesse caos da pandemia.Mas não podemos nos entregar ao fetichismo do estatismo quando temos soluções óbvias, como bolas quicando na nossa frente.
Agora, vamos trabalhar algumas ressalvas importantes para não cair no fanatismo de só enaltecemos os pontos bons e nos esquecermos dos problemas: primeiro que não existe livre mercado sem concorrência, fazer monopólio ou um duopólio com empresas estatais ou privadas fere qualquer tipo de livre mercado. No caso da CEDAE, apenas 2 empresas dividiram o mercado, isso é um duopólio e é perigoso. É preciso entender se a modelagem contratual utilizada irá realmente resolver o problema, já vimos muitos fatos com relação a isso nos governos passados, concessões mal feitas geram problemas ainda maiores de abandono e quebra de expectativas.
Segundo, foi colocado um teto que limita o reajuste da tarifa, ou seja, ele será corrigido apenas pela inflação. Eu não preciso explicar para vocês como o controle de preços nunca deu certo no Brasil, e não está dando hoje, nem na Venezuela e nem na Argentina, então esse é outro péssimo sinal. Apesar disso, é muito importante ressaltar como, aos poucos, os brasileiros comuns estão despertando para os reais benefícios do livre mercado.
Vamos torcer para que esse projeto dê certo, que o Rio de Janeiro resolva o seu problema com o saneamento em definitivo e que sirva de exemplo para o resto do Brasil.
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#manoel thiago furtado