É uma questão de tempo: o libertarianismo engolirá a direita!
Creio ser importante deixar claro, desde já, que inferir o fato de o libertarianismo engolir o espectro da direita no futuro não significa que o mesmo seja uma parte da direita. A verdade é que o libertarianismo não se encaixa nessa linha unidimensional simplista da análise política filosófica. Mas existe de fato um certo denominador comum entre o libertarianismo, o liberalismo clássico e o conservadorismo burkeano. É por isso que há uma forte tendência da cooptação de mentes ao libertarianismo no futuro. O libertarianismo não se juntará à direita, ele engolirá os membros da direita para seu espectro. Para entendermos isso friamente é preciso voltar no tempo e elucidar alguns pontos-chave desta análise.
O libertarianismo no seu corpo mais moderno como conhecemos foi cunhado já no século XX, principalmente por pensadores da Escola Austríaca e objetivistas. Algumas características notáveis dessa linha filosófica são sua análise fria e realista das interações humanas além de uma linguagem didática e acessível, sem muitos tecnicismos e o uso de um sistema lógico-dedutivo rígido de análise. Já na metade do século passado, os libertários americanos, vendo o crescimento exponencial de seu movimento, decidem extrapolar a academia e se organizar socialmente e politicamente. Surgem diversos think-tanks, revistas, fóruns e um partido libertario. Por anos, muito graças a Rothbard (o criador do anarcocapistalismo) e Konkin, o movimento libertário tenta se aliar mais com a esquerda americana. Mas isso logo torna-se um problema e percebe-se que os progressistas começam a relativizar os princípios libertários puxando o movimento para o coletivismo. Começa a surgir uma necessidade de fazer aliança com o outro lado do espectro político-ideológico.
Já mais velho, Rothbard se une a Lew Rockwell e decide evocar as “as raízes conservadoras” do libertarianismo para resgatar a proposta original do movimento. Dessa vez foi visto um efeito mais dentro do esperado. A direita americana não tenta relativizar os princípios libertarios e graças a figuras como Ron Paul, ela foi cooptada pelo libertarianismo em grande número. Hoje o partido libertário é o terceiro maior partido dos Estados Unidos e muitos políticos do partido Republicano (considerado o partido de direita por lá) se intitulam libertários. Houve também a retomada do grupo austrolibertário Mises Caucus, da maioria da coordenação do partido libertário recentemente, o que devolve grande esperança de ótimos rumos para essa instituição, bem longe do progressismo tóxico.
Falando especificamente no caso do Brasil vemos um crescimento exponencial do movimento libertário. Aqui o austrolibertarianismo é apresentado e organizado com mais força pela criação do Instituto Mises com os irmãos Chiocca de São Paulo no início dos anos 2000. Com um acesso à internet ainda restrito para boa parte da população e as redes sociais em suas formas primordiais, o libertarianismo era assunto na boca de poucos. É com a queda da popularidade petista no segundo mandato Dilma que as ideias da liberdade começam a ser rediscutidas. Nesse momento o libertarianismo começa a ganhar mais força e, além da revolta contra a esquerda, temos um grande crescimento e acesso às redes sociais.
Com a grande polarização política das eleições de 2018 o movimento libertário explode em números, canais de YouTube, páginas e novos think-tanks começam a se multiplicar e crescer. O último grande boom libertario brasileiro foi devido a abusos do governo durante a pandemia de covid de 2020. O meio libertario está mais vivo e ativo do que nunca.
O libertarianismo possui uma linguagem acessível e inteligível até mesmo para um adolescente. Não é à toa que existe um grande número de libertários iniciantes desde os 14 anos até os mais maduros que passam da faixa dos 40 anos. O espírito mais radical do jovem e a produção de conteúdo libertario de forma didática tornam esse público altamente suscetível às nossas ideias. Mas se difundir entre os jovens não é o bastante. Estamos observando uma invasão libertária em todas as correntes mais clássicas da direita. Vamos entender exatamente o porquê isso tem ocorrido.
Vemos que o conservadorismo se pauta muito pelas suas raízes jusnaturalistas e racionalistas. Por outro lado, há um grande apego conservador às virtudes, como a prudência. O libertarianismo, por sua vez, enxerga a moralidade como algo mais subjetivo de cada indivíduo, mas não nega que ela exista. Implicitamente, o próprio PNA é um julgamento moral sobre os direitos naturais do homem. Já o objetivismo Randiano não se poupa e inclusive propõe um conjunto específico de virtudes para o indivíduo racional e livre.
Avaliando desta forma, o libertarianismo possui as mesmas qualidades do conservadores (como conservar virtudes, valores morais e instituições descentralizadas como a família) mas não abraça os problemas do conservadorismo (como uma defesa restrita das liberdades individuais, maior aceitação da ação estatal e utilitarismo).
Nesta análise não é possível deixar o liberalismo de fora. Ainda existe uma crença um tanto equivocada que o libertarianismo descende do liberalismo clássico. Ao avaliar com maior profundidade percebe-se que o libertarianismo nasce de uma união muito específica de correntes de pensamento que se diferem do liberalismo há séculos. No caso do movimento liberal atual houve grande ramificação do seu espectro e a maior parte dele se arranjou num estável casamento com o progressismo.
O liberal de esquerda compõe uma contradição ambulante capaz de afirmar os maiores absurdos para se viabilizar. Avaliando a experiência de Rothbard, uma aliança com esse movimento não é frutífera e gerou enormes estragos no movimento libertario infiltrando a cultura progressista nele. É um tanto interessante observar que a capilaridade libertária é muito mais fácil e rápida no meio conservador do que liberal (apesar das alegadas semelhanças).
O liberais de esquerda têm sido considerados um caso perdido para o libertarianismo e é por isso que nosso movimento foca na infiltração dentro do restrito movimento liberal clássico. Neste subgrupo liberal é possível ver o libertarianismo florescer por maior consistência nas defesas das liberdades individuais e falta de relativização dos direitos naturais.
É notório que a esquerda tem se radicalizado e lançado cada vez mais tentáculos no espectro político-ideológico mundial. As políticas são cada vez mais abusivas, o controle estatal maior e mais centralizado. O globalismo não para de avançar em sua agenda e a direita mantém a mesma limpeza do discurso moderado e prudente. Apenas a radicalização libertária é capaz de lutar, com vigor, contra todos esses abusos. Agindo por diversas vias, desde a academia, passando pela política e mudanças sociais diretas, o movimento libertario se propõe a sujar as mãos para conter a ameaça global contra os indivíduos livres.
A direita já está há muito tempo acanhada, se reduzindo a discussões puramente técnicas e acadêmicas. Conservadores recheados de positivismo e liberais sendo domesticados pela cultura progressista fazem da direita um grande motivo de deboche atual. Os problemas reais e palpáveis são assuntos que, até então, tornaram-se exclusividade da esquerda. Mas agora o pesadelo dessa esquerda está alcançando maior destaque no cenário sócio-político.
O libertarianismo trata dos assuntos comuns na linguagem dos comuns. Propõe soluções lógicas e palpáveis. O libertarianismo não vive de relativizar seus princípios para criar viabilidade política. Os posicionamentos dados pelos pensadores libertários há 60 anos se mantêm e isso traz seriedade ao movimento.
Atualmente, já existem congressistas brasileiros que bradam “imposto é roubo” em sessão plenária cheia. O livro mais vendido de economia no momento é “As 6 lições” de Mises. Cada vez mais conservadores não conseguem sustentar o argumento de liberar o porte de armas mas não liberar o amplo uso da maconha – e por isso eles também estão cada vez mais falando em PNA e escola austríaca.
Liberais progressistas vêm sendo empurrados para o escanteio do debate público mainstream. O libertarianismo cultural e acadêmico está se tornando uma realidade altamente popular no Brasil. Se qualquer político, influenciador ou intelectual de direita quer vingar no Brasil, é imperativo que ele se converta urgentemente ao libertarianismo. Caso contrário, cairá no mesmo limbo do esquecimento que seus correligionários atuais.
#FAL